sábado, 26 de novembro de 2011

72 horas in clown - É falta de educação falar do nariz dos outros


Fim do dia 1 - 24/11





Ao fim do dia estava exausto. O nariz impõe minha presença aos outros. Se a princípio eu achei que iria me dar uma certa liberdade maior por estar mascarado, a máscara me poe em evidência. Tanto para os outros quanto para mim mesmo. Estar em evidência por uma, duas horas é uma coisa, é mesmo meu trabalho. Mas durante todo o tempo ser lembrado por um elemento externo que você está ali naquele momento e naquele lugar é extremamente cansativo.
Por muitas vezes me pegava adiantando processos, pensando já no que poderia acontecer ao chegar em tal lugar ou falar com tal pessoas com o nariz. Não podia simplesmente fingir que não existia ou passar qualquer momento em estado de mecanização. A relação que mais me impressionou por ser inesperada foi a minha comigo mesmo. Me ponho em evidência não só no lugar em que passo por estar diferente, mas para mim mesmo.
Quanto aos outros, é interessante como as pessoas ou precisam de alguma explicação para o que acontece ou simplesmente ignoram. Os lugares onde senti meu nariz ser mais ignorado foram em lojas ou estabelecimentos em que eu seria atendido (deve haver algum tópico no treinamento que afirme que não é educado olhar pro nariz vermelho dos outros) e na UNIRIO, faculdade de teatro em que mais uma vez minha teoria de que qualquer performance praticada naquele espaço torna-se esvaziada por virar banalidade. Um homem com nariz de palhaço, o que tem de diferente nisso?
Como lidar com as crianças? Assumi um papel lúdico. As crianças não questionam se é um homem com nariz de palhaço, mas reconhecem o palhaço em si. Não há o estranhamento mas a identificação. Como lidar com isso foi uma das questões enfrentadas. Resolvi assumir o papel que elas esperavam de mim e brincar com o jogo. Foram os momentos mais tranquilos do dia, quando eu e o nariz representávamos algo só. Talvez durante todo o tempo eu briguei com o nariz. Me vi inconscientemente desviando caminhos para evitar passar por certos lugares com número maior ou tipo específico de pessoas.
No final do dia, ocorreu o inesperado de perceber que as pessoas podem associar o nariz a algum defeito físico real, não lendo o nariz como algo inorgânico em mim. Comentários me fizeram repensar todos os olhares que havia recebido durante o dia. O nariz não tem uma cor forte e é, segundo alguns, bastante orgânico.
No fim das contas, não houve grande transformação além dos olhares estranhando e ignorando logo depois. Porém estar nesse lugar durante todo o tempo impondo a mim mesmo a minha presença... sem contar o vapor no óculos e a dificuldade de respirar.

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